Márcio Túlio Viana - 70 ANOS DE CLT - UMA ANÁLISE VOLTADA PARA OS ESTUDANTES E OS QUE NÃO MILITAM NA ÁREA ...

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//-->10.12818/P.0304-2340.2013v63p64770 ANOS DE CLT: UMA ANÁLISE VOLTADAPARA OS ESTUDANTES E OS QUE NÃOMILITAM NA ÁREA TRABALHISTA70 YEARS OF “CLT”: AN ANALYSIS DIRECTED TOSTUDENTS AND THOSE WHO DO NOT WORK ONTHE LABOR LAW AREAMárcio Túlio Viana*RESUMONascida há 70 anos, a lei geral do trabalhono Brasil – CLT – não só ajudou a elevara condição econômica dos trabalhadores,como os transformou em sujeitos de direitos.De algum tempo para cá, porém, tem sidoquestionada e modificada. Esse texto resumeo seu passado, presente e futuro, abordandotambém a questão sindical e descrevendoalguns aspectos das relações trabalhistas noBrasil.PALAVRAS-CHAVE: CLT. Lei trabalhistabrasileira. Relações de trabalho no Brasil.Flexibilização. Sindicato.ABSTRACTBorn 70 years ago, the general labor law inBrazil - CLT - not only helped raising theemployees’ economic status but also turnedthem into subjects of rights. From a timeago to now, however, it has been questionedand modified. This text summarizes its past,present and future, addressing also thequestion of union association and describingsome aspects of labor relations in Brazil.KEYWORDS:CLT. Brazilian labor law. Laborrelations in Brazil. Flexibility. Union.1.INTRODUÇÃOHá alguns anos, num 1º de maio, em Aparecida do Norte,os flashes dos repórteres surpreenderam uma cena simbólica etocante: milhares de operários, reunidos na praça, levantavamas suas carteiras de trabalho para a bênção da santa.Com esse gesto, é possível que eles quisessem –magicamente – garantir o próprio emprego; mas também*Professor da Faculdade de Direito da UFMG e PUC/MG.Rev. Fac. Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 63, pp. 647 - 670, jul./dez. 201364770 ANOS DE CLTexpressavam a sua condição de cidadãos, ainda que nãoporinteiro,no plano da realidade vivida.Aparentemente, o que eles tinham nas mãos eram apenasaquelas carteiras. Mas elas simbolizavam toda a legislação queos protege, e que pouco a pouco foi-lhes dando ao menos essameia-cidadaniaque há 70 anos era pouco mais do que um sonho.Não que antes dela nada houvesse. Tínhamos já um bomcomeço. Mas a CLT1foi um marco tão grande em nosso Direitodo Trabalho que quase se pode dizer que ambos nasceramjuntos; e guarda uma história de amor tão profunda com opovo brasileiro que tem resistido – graças a ele – a boa parte daspressões dos que tentam destruí-la.Na verdade, desde o seu nascimento – em 1º de maiode 1943 – a CLT conheceu tanto os aplausos de gerações dejuristas como duros ataques de seus inimigos. Passou por golpese contragolpes, ditaduras e democracias. Foi dividida e partilhadaem incontáveis congressos e salas de aula e multiplicou-se emmilhares de livros, artigos, sentenças, pareceres e petições.Desde os anos 90, especialmente, tem vivido a tensão entreas suas regras protetivas e uma realidade que desprotege; entre osseus velhos princípios e uma nova ideologia; entre o antigo perfilda fábrica e o modelo imposto pela reestruturação produtiva;entre a pretensão modernista de uniformizar o fragmentado ea tentação pós-moderna de conviver com o fugaz, o variado eo pragmático. Suas aventuras se povoaram de desventuras, masainda hoje são salpicadas de sonho.2.BREVES NOTAS SOBRE A “BELLE ÉPOQUE”BRASILEIRANo início do século XX, as maiores cidades brasileiras –naquele tempo, ainda bem pequenas – já ofereciam uma paisagem1Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n. 5.452/1943.648Rev. Fac. Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 63, pp. 647 - 670, jul./dez. 2013Márcio Túlio Vianade contrastes, misturando os pés descalços de seus pobres comos chapéus e bengalas de seus senhores.Com os pés descalços viviam os antigos escravos, oufilhos de escravos, que perambulavam sem rumo – uns, porfalta de opção, e outros por opção mesmo, afirmando com o seunão-trabalho a sua condição de homens livres2. Durante certotempo, esses pés não podiam pisar nas ruas do centro do Rio,nem frequentar os parques da cidade.De bengala na mão eram vistos não só fazendeiros – queexibiam na cidade as elegâncias compradas com o seu café – mastambém comerciantes, bacharéis e os primeiroscapitãesde umaindústria que ainda engatinhava, e se reduzia, quase sempre, apequenas fábricas de fundo de quintal.Entre uns e outros – talvez usando chapéus, mascertamente sem bengalas – estavam trabalhadores portugueses,espanhóis, alemães, suíços e italianos, que o Governo haviaatraído para o lugar dos antigos escravos, às vezes financiando-lhes as passagens.Não que faltasse mão de obra nacional; mas a imensamaioria dos brasileiros era gente analfabeta, habituada aoscostumes do campo e avessa aos valores da cidade. Mesmo osque conseguiam emprego na fábrica tendiam a vê-la como umasimplespassagem:lugar de juntar dinheiro para depois voltaràs origens.Assim, o que faltava era trabalho qualificado, disciplinadoe identificado com a vida operária – qualidades que os imigrantes,mesmo quando camponeses, eram mais aptos a oferecer. Muitosdeles tinham apenas um projeto pessoal: fugir das duras condiçõesde sua terra, correr os riscos de uma nova vida e – se possível –enriquecer. Mas outros sonhavam com um mundo melhor: eramsocialistas, comunistas e sobretudo anarquistas. Foram eles os2A observação é de CARDOSO, Fernando Henrique.Capitalismo e escravidão noBrasil meridional: o negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul.Rio deJaneiro: Paz e Terra, 1977, p. 35.Rev. Fac. Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 63, pp. 647 - 670, jul./dez. 201364970 ANOS DE CLTprincipais responsáveis por uma transformação estrutural naorganização operária, que aos poucos trocava o mutualismoe a colaboração pela resistência e conflitualidade. Em outraspalavras, pelosindicato.Numa época de belos discursos e poucos ouvintes, osanarquistas recorriam a jornais, filmes, teatros e piqueniques paramostrar que era preciso – e possível – transformar o mundo pelaação direta, ainda que com violência. Mas o que eles ofereciamaos outros operários era também um espaço urbano, em trocado que lhes era negado pela metrópole.Mas essasassociações de resistênciaeram instáveis efugazes: às vezes, nasciam e morriam com o próprio conflito.Por isso, no início, não incomodavam tanto, a não ser duranteos (poucos) conflitos. Afinal, o grande motor da economia aindaera o campo. Pela mesma razão, tanto quanto os seus próprioslíderes, a propaganda revolucionária circulava livremente.Na verdade, o discurso anarquista encontrava resistênciaentre os próprios trabalhadores brasileiros. Homens rudes docampo, não sabiam sequer assinar o nome, e não tinham vividoa exploração capitalista nos mesmos moldes dos trabalhadoreseuropeus. Além disso, era-lhes difícil rejeitar a fé cristã e os seusantigos valores.De todo modo, na medida em que a indústria – lentamente– crescia, os anarquistas se tornavam mais visíveis e perigosos.A LeiAdolfo Gordopermitiu a extradição de seus líderes,enfraquecendo o movimento e abrindo novos espaços parasocialistas, comunistas e principalmente reformistas. Pouco apouco, surgem novos sindicatos – já agora, organizados porramos de atividade – dispostos a negociar ganhos imediatospela aderência ao sistema e assim disciplinando a própria forçaoperária3.3A propósito, cf. BIHR, Alain.Du grand soir à l´alternative.Les Éditions de L´atelier:Paris, 1991,passim.650Rev. Fac. Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 63, pp. 647 - 670, jul./dez. 2013Márcio Túlio VianaÉ nessa época que surge a figura contraditória, carismáticae quase lendária de Vargas, o caudilho dos pampas gaúchos quecomeça a romper com um passado agrícola e dependente, abrindoas portas para a fábrica e para o mercado interno.Não à toa, ele manda fazer medalhões com sua efígiede um lado e o do Papa Leão XIII do outro4: desse modo nãoapenas revela a origem de suas idéias, mas se afirma como anova versão do velho pontífice, cujas palavras – imortalizadasna Encíclica Rerum Novarum – tinham ajudado a construir oDireito do Trabalho. Mas talvez ele quisesse ainda insinuar-secomo uma espécie de santo ou mártir, o que de certo modo acabouacontecendo mais tarde, especialmente com o suicídio.Segundo Gabriela Delgado, valendo-se de Ângela deCastro Gomes,o projeto estatal articulou uma lógica material, fundada nosbenefícios da legislação social, com uma lógica simbólica, querepresentava estes benefícios como doações5, o que incutia nostrabalhadores o sentimento de gratidão e de retribuição6.A partir de Vargas, a economia perderá sempre maisespaço para os produtosmade in Brazil.A política de substituiçãode importações fez crescer as cidades, mudou o perfil da classeoperária e inseriu o Brasil, ainda que tardiamente, no sistemacapitalista industrial.Vargas cria a Petrobrás, suspende o pagamento da dívidaexterna, corta o país de ferrovias, regula a remessa de juros parao exterior e começa a quebrar o antigo poder dos coronéis.45Informação colhida na bela conferência proferida por Gabriela Neves Delgado, noSuperior Tribunal do Trabalho, sobre os 70 anos da CLT, em maio de 2013.GOMES, Ângela de Castro.A Invenção do Trabalhismo.São Paulo: Vértice, EditoraRevista dos Tribunais; Rio de Janeiro: Instituto Universitário de Pesquisas do Rio deJaneiro, 1988. p.23.DELGADO, Gabriela Neves.ACLT AOS 70 ANOS: rumo a um Direito do Trabalhoconstitucionalizado.Mimeo,2013, p. 76Rev. Fac. Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 63, pp. 647 - 670, jul./dez. 2013651 [ Pobierz całość w formacie PDF ]

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